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Le Roi Cassé

capa Le Roi CasséAutor: Nicolas Dumontheuil
Editora: Casterman

Dumontheuil é o mestre incontestável do absurdo na 9ª arte francófona, e prova-o mais uma vez nesta nova BD em que a guerra assume um papel central. Em Le Roi Cassé, a Primeira Guerra Mundial é descrita como um acontecimento sem sentido nenhum, em que já nem os próprios chefes de estado sabem o que a fez começar. A carnificina que daí advém é tal, que até a própria Morte fica horrorizada com a quantidade de cadáveres. O que a vai levar a fazer um acordo com o soldado Virjusse, o último a ser morto antes do armistício (enquanto, escondido, contava os minutos para o fim da guerra…). A Morte, reúne-se então com os chefes de estado, e convence-os a fazerem uma pausa nos combates até ao fim da guerra, que acontecerá 9 meses depois, no dia 11 de Novembro. Para selar o pacto, oferece-lhes o último morto desta guerra, Simon Virjusse, que deverá morrer momentos antes das tréguas se tornarem oficiais.

Através desta fábula irreal, Dumontheuil, denuncia a hipocrisia dos que ficam longe da frente de batalha e que não olham mais além do que o seu umbigo. Ao longo de 96 páginas, somos mergulhados num mundo completamente absurdo onde a estupidez, a vaidade e o egoísmo são lei. A aberrante ascensão de Virjusse ao estatuto de herói nacional, é sempre pautada pelo genial sentido de humor, baseado em contra-sensos, que caracteriza os diálogos de Dumontheuil. Além disso, Le Roi Cassé, aborda o tema kafkiano, recorrente na obra do autor, do indivíduo esmagado por circunstâncias que lhe são impostas e que ele não percebe, face à naturalidade com que a sua situação é encarada pelos que o rodeiam.

Infelizmente, Dumontheuil abandonou a colorização directa que tantos elogios lhe valeu noutras obras, como em Qui a tué l’idiot (vencedor do melhor álbum em Angoulême em 1997). Sendo assim, as cores quentes e vibrantes de outros tempos dão lugar a uma colorização mais sombria, que faz com que o seu traço caricatural perca muito da textura mais plástica de outros tempos. Mas tirando esta pequena decepção, o traço de Dumontheuil mantém as características que podem fazer lembrar Rabaté ou mesmo Blutch.

Não estando ao nível do magistral Qui a tué l’idiot, Le Roi Cassé contém todas as qualidades de um romance burlesco e o destino de Virjusse é implacável, demonstrando que a morte física não é nada quando comparada com a social. Recomendo aos fãs de humor absurdo.

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Raio X #4

descriçãoBatman #655-656
Argumento: Grant Morrison – Desenho: Andy Kubert – Editora: DC

É mau sinal quando passado 5 ou 6 páginas o leitor não percebe o que se está a passar, não porque o autor utilize referências obscuras, mas porque a narrativa é confusa. Isto é ainda pior quando acontece num título de super-heróis… Muito se esperava de Morrison em Batman, mas até agora tem sido tudo bastante enfadonho, e pouco inovador, neste arco em que Batman conhece o seu filho e tem lutar com homens morcego gigantes (algo que já foi utilizado em Usagi Yojimbo…). Embora sejam poucos, também existem bons momentos, como quando Batman combate com os morcegos gigantes rodeado por quadros de pop art com balões de BD que reflectem o que se está a passar na história. A arte de Kubert é dinâmica o suficiente para um título deste género, mas não faz mais do que cumprir o seu papel. 5/10


Detective Comics #821-822
Argumento: Paul Dini – Desenho: J.H.Williams III (#851) e Don Kramer (#822) - Editora: DC

Só pelas capas de Simone Bianchi já vale a pena comprar este título… Paul Dini decidiu não fazer grandes arcos e portanto cada número é auto-conclusivo e gira à volta de premissas bastante simples. Como o próprio título indica, aqui foca-se mais a faceta de investigador de Batman. Ambas as histórias são bastante interessantes, e têm o seu quê de reminiscente da Bronze Age, embora no #822 a ideia de partida (Riddler tornou-se detective e ajuda a polícia) seja mais forte. No entanto, perdeu-se muito com a saída de J.H. Williams. A composição das suas páginas é exímia e tudo serve para fazer uma vinheta, até a própria capa do Batman. O traço de Kramer faz lembrar Williams, mas tem uma abordagem muito mais convencional. 7/10


Fell #6
Argumento: Warren Ellis – Desenho: Bem Templesmith – Editora: Image

Ellis continua a explorar Snowtown através das investigações do detective Fell. Cada número contém uma história completa, e graças às pistas que Ellis vai deixando, aos poucos vamos conhecendo melhor cada personagem (sendo, sem dúvida, a mais intrigante, a freira que se mascara de Nixon…). O relacionamento entre Fell e Mayko é bastante simples, mas uma pequena esperança no meio da cidade desoladora que é Snowtown. Como nos outros números Ellis inspirou-se em factos reais para criar um criminoso doentio, lembrando-nos que os actos mais atrozes acontecem mais perto de nós do que gostaríamos de pensar. A arte de Templesmith transmite o ambiente fantasmagórico da cidade, ao mesmo tempo que a colorização estabelece o contraste entre o que de melhor e pior existe em Snowtown. Uma excelente leitura, como sempre. 9/10

DMZ Vol. 1: On the ground

Capa DMZ TPBArgumento: Brian Wood
Desenho: Riccardo Burchielli
Editora: DC/Vertigo

Já pouco se fala de ficção científica hoje em dia, “mundo pós-apocalíptico”, “distopia” e “futuro próximo”, são expressões mais pomposas que afastam o estigma de literatura de cordel associado a esta corrente. No entanto, uma parte das séries mainstream de sucesso, publicadas nos USA, são títulos de ficção científica, veja-se Y The Last Man, The Walking Dead e agora DMZ. É certo que não estão presentes humanóides verdes, nem tecnologia altamente avançada, sistemas políticos opressivos e autoritários, mas há uma reestruturação do presente com base no que se poderia tornar o nosso futuro.

Em DMZ, isto passa pela introdução de uma segunda guerra civil americana, disputada em plena Nova Iorque há 5 anos. Uma milícia organizada, os Free States, ocupou os territórios de New Jersey e o que fica para oeste, enquanto que as tropas americanas estão instaladas em Brooklyn, Queens e Long Island. Exactamente entre as duas facções inimigas situa-se a Ilha de Manhattan, uma zona desmilitarizada (a “DMZ”), onde vai aterrar Matty Roth, um estagiário de fotojornalismo. Matty está a acompanhar a primeira equipa que vai fazer uma reportagem em Manhattan depois de ter começado a guerra, quando tudo corre mal e acaba por ficar sozinho em plena “no man’s land”. Matty cresceu nos subúrbios, onde impera a classe média/alta, e viveu uma vida abastada e protegida, a sua preparação para um ambiente hostil é nula o que nos faz ter bastante empatia pela sua personagem. Mesmo achando que, o principal defeito destes primeiros números de DMZ, seja uma caracterização das personagens muito superficial, principalmente no caso de Matty e Zee, a sua guia em Manhattan. Wood preferiu mostrar vários aspectos do quotidiano e da nova organização desta Manhattan em estado de sítio, um pouco como Ellis fez nos números mais tardios de Transmetropolitan, quando Spider Jerusalem pouco mais era do que os olhos do leitor. As ideias de Wood são boas e muito interessantes, mas no final fiquei com a impressão que falta substância a um título que pode ser muito mais.

A arte está dividida entre Wood e Burchielli, um desenhador italiano. Brian Wood trata das capas e das páginas em que são apresentados excertos televisivos da Liberty News, a agência que enviou Matty para o terreno. Nos seus desenhos utiliza o seu já conhecido estilo muito design, o que funciona muito bem para transmitir uma sensação de manipulação mediática no tratamento da informação. O traço de Burchielli é realista e com uma atenção especial aos cenários, que são desenhados meticulosamente, o que contribui em muito para estabelecer o ambiente de guerra urbano numa metrópole como Nova Iorque.

Ao ler estes primeiros cinco números de DMZ fiquei com a ideia que a história fica aquém daquilo que poderia ser. Wood estabelece muito bem o cenário, mas falta conteúdo, apesar de ser possível vislumbrar os caminhos que a narrativa pode tomar. Embora não tenha ficado já completamente rendido a este título acho que o próximo TPB é capaz de mudar isso.

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